Este post diz respeito a algo que só fui conhecer quando comecei a viver o problema. A epicondilite medial e lateral são dores na região do cotovelo e problemas recorrentes na vida do escalador de intermediário e alto nível. Para que eu possa explicar como essa lesão se desenvolve tão comumente mostrarei primeiro um pouco da anatomia do antebraço e em seguida alguns exercícios para o fortalecimento dos músculos antagônicos na escalada, ou seja, músculos que não são recrutados com tanta intensidade na prática da escalada e que por consequência acumulam microtraumas nos tendões quando se escala com muita frequência vias e boulders de graduação hard (o que depende de cada pessoa) com pouco descanso entre as sessões.
Primeiramente, o sufixo ITE dá significado de inflamação e portanto as epicondilites são inflamações nos epicôndilos medial (anterior e parte de dentro do antebraço) e lateral (posterior e parte de fora do antebraço).
O que são os Epicôndilos?
São pequenas eminências tuberculadas situadas no final do Úmero, o osso do famoso Músculo Bíceps.
1.1 Epicôndilos do Úmero e Músculos Rotadores do Antebraço |
Agora, gostaria que entendessem que a perfeita funcionalidade das mãos demanda um grupo muscular de altíssimo requinte e consequente complexidade e obviamente de extrema importância na prática da escalada. Para explicar melhor, dividirei os músculos do antebraço em três grupos.
1. Grupo Anterior: Sua função principal é de flexão dos dedos e fica situado na parte de dentro do antebraço (medial). É o segmento que acompanha a palma de sua mão e dobra o pulso. Este grupo muscular é sem duvidas o mais requisitado em nosso esporte e é formado por 8 músculos: Pronador Redondo, Flexor Radial do Carpo, Palmar Longo, Flexor Ulnar do Carpo, Flexor Superficial dos Dedos, Flexor Profundo dos Dedos, Flexor Longo do Polegar e Pronador Quadrado.
1.2 Flexores do Antebraço |
1.3 Flexores do Antebraço |
1.1 Por quê se desenvolve a Epicondilite Medial na escalada?
Nas imagens 1.2 e 1.3, perceba um detalhe importante. Todos os músculos com exceção de apenas um (Flexor Profundo dos Dedos) se inserem no Epicôndilo Medial e mais ainda, na foto 1.1 veja que o Músculo Pronador Redondo, cuja função é manter o antebraço em Pronação¹, também tem inserção no mesmo lugar. No entanto, a contração do M. Bíceps gera o movimento de Supinação². Este simples fato é a razão de todo o problema.
A batalha entre o movimento de Supinação gerado pela puxada do Bíceps, e a necessidade de deixar o antebraço em Pronação para manter a pegada na rocha gera extrema tensão no M. Pronador Redondo e seus anexos tendíneos no Epicôndilo. Por ser um músculo antagônico, é geralmente sem treinamento e por isso, a tensão gerada desenvolve microtraumas em seus tendões.
Marizinha no Passível (V2) em Ouro Preto - MG |
Eu na via Cortina de Fumaça (7c/8a Br) na Serra da Bocaina - MG Foto: Daiex Almeida |
Assim como os músculos se recuperam e ganham novos níveis de força, os tendões também o fazem, porém de forma muito mais lenta. Eventualmente, os músculos serão capazes de criar mais força que os tendões podem aguentar e o resultado é: Epicondilite Medial.
A inflamação pode ser desenvolvida de várias formas e na medicina é comumente chamada de Cotovelo de Golfista, pois o esporte também gera a mesma lesão, porém por outro tipo de movimentação.
¹ O movimento de Pronação do antebraço pode ser entendido quando esticar seus braços para frente e virar a palma de sua mão para baixo.
² Supinação é o contrário da Pronação, com os braços esticados à frente e a palma de sua mão para cima.
1.2 Identificando e resolvendo a inflamação
Existem níveis de dor da inflamação. Ela se manifesta no inicio como pontadas de dor ou dolorimento enquanto escala ou após a escalada. A inflamação se desenvolve mais seriamente quando, em um movimento muito hard, você sente uma dor aguda. Esse momento é geralmente muito fácil de ser identificado, pois a dor é intensa e geralmente seguida por suor na área afetada.
Tudo isso pode ser evitado com o fortalecimento correto da musculatura e uma dinâmica de escalada consciente. Escalar é pura precisão, você pode evitar muitas lesões utilizando mais os pés do que a força bruta.
Como qualquer lesão, você pode dominá-la e acelerar sua recuperação com o reconhecimento antecipado dos sintomas e tratamento proativo. Uma abordagem madura do acontecimento pode ser a diferença entre seis semanas ou seis meses sem escalar!
Caso já esteja enfrentando essa questão, coloque gelo 3x ao dia durante 15 minutos e sempre que for escalar, considere:
1. Aquecer o cotovelo com bolsa quente;
2. Sempre fazer exercícios de aquecimento do corpo em geral como pular corda ou correr durante alguns minutos;
3. Aquecer os cotovelos isoladamente com massagem e fazer o exercício que será passado a seguir até 3x na semana.
Pode parecer um pouco chato fazer isso tudo, mas mais chato ainda é não conseguir escalar!
Se escala e nunca sentiu essa dor, ótimo! Existem muitos exercícios para o fortalecimento do M. Pronador Redondo, faça-os antes de seus exercícios específicos e provavelmente nunca passará por isso.
Este exercício é o mais fácil deles. Utilize um martelo de aproximadamente 1,5kg e tente realizar 2 sets de até 30 repetições. O peso parece pouco mas não queremos músculos maiores (e mais pesados) e sim músculos mais resistentes. Pegue na ponta do martelo e posicione-o com a palma da mão virada para cima, eleve-o até a vertical e volte.
2. Grupo Posterior: A função principal deste grupo é a extensão e fica situado na parte de fora do antebraço (lateral). É o segmento que acompanha a costas de sua mão e estica seu pulso para trás. Este grupo é formado por 8 músculos: Extensor dos dedos, Extensor do dedo Mínimo, Extensor Ulnar do Carpo, Ancôneo, Abdutor longo do Polegar, Extensor curto do Polegar, Extensor longo do Polegar e Extensor do Indicador. Considerados antagônicos em nosso esporte devem ser treinados separadamente para que não haja um desequilíbrio muscular e resulte em lesões. O desequilíbrio deste grupo é o gerador da Epicondilite lateral e explicarei a razão em seguida.
1.4 Extensores do Antebraço |
1.5 Extensores do Antebraço |
2.1 Porque se desenvolve a Epicondilite lateral na escalada?
Esta inflamação tem um motivo muito mais simples de compreender. Nas imagens 1.4 e 1.5, note que os músculos extensores são ligados no Epicôndilo lateral e antagonistas aos flexores, os músculos utilizados predominantemente na pegada da escalada. Portanto, os extensores são geralmente desproporcionalmente fracos comparados aos flexores e sofrem microtraumas ao passo que seu nível de escalada gradualmente se eleva.
2.2 Identificando e resolvendo a inflamação
A ocorrência da Epicondilite Lateral (ou cotovelo de tenista) é menos comum na escalada, mas acontece. Os modos de identificar e retificar são os mesmos da Epicondilite Medial, no entanto os exercícios são diferentes.
Uma maneira de evitar essa lesão é tentar regletar o mínimo possível, deixando para quando for de extrema necessidade. Eu sei que é difícil, eu também adoro regletar, mas utilizar a pegada primata é muito mais seguro.
Pegue um peso de até 2kg e tente realizar 2 sets de 25 repetições. Deite o braço em cima da coxa e firmemente segure o peso na posição horizontal e dobre o pulso para cima até o final e segure por 1 segundo, depois abaixe até a posição inicial. Evite deixar o peso passar da posição horizontal e descer. Caso consiga fazer as 25 repetições tranquilamente, aumente o peso gradualmente até no máximo 6kg. Não passe disso, como já disse anteriormente não queremos músculos maiores, e sim mais resistentes!
3. Grupo lateral: Embora seja um grupo de apenas 4 integrantes, este contêm músculos de muita importância como o Supinador, cujo nome já diz sua função e o Braquiorradial, auxiliador da Pronação e responsável pela flexão do cotovelo. Os outros dois são os Extensores Curto e Longo do Carpo. Todos eles apresentados respectivamente na imagem abaixo.
Bom, espero que tenha sido de grande ajuda a vocês e qualquer dúvida ou sugestão para o blog me mandem por e-mail: fernandoduhp@gmail.com
Abraço, Fernando